Terra para o campo e para cidade: trabalhadores/as trocam experiências no Assentamento Contestado

Durante visita ao Assentamento na cidade de Lapa/PR, cerca 40 pessoas que moram ou atuam em comunidades de Curitiba puderam conhecer a Escola Latino Americana de Agroecologia e a produção agroecológica desenvolvida no local. A troca de experiências faz parte das atividades desenvolvidas no projeto ‘Formação Político–Cidadã para o mundo do trabalho’, desenvolvido pelo Cefuria em parceria com a Fundação de Ação Social (FAS).

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Texto e fotos por Franciele Petry Schramm, comunicadora popular do Cefuria

“A exclusão que se dá no campo é a exclusão da cidade”. A constatação do agricultor e assentado da reforma agrária, Antônio Capitani, traduziu bem o intercâmbio realizado entre moradores e moradoras de Curitiba no Assentamento Contestado, em Lapa.

Se existem ao menos 10 mil famílias acampadas no Paraná para serem assentadas pela Reforma Agrária, Curitiba conta atualmente com um déficit habitacional de quase 50 mil casas, segundo dados da Fundação João Pinheiro. Outras 5 mil pessoas também em situação de rua na capital paranaense, pelo indicativo do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR).

As 40 pessoas que visitaram o espaço no último dia 30 atuam ou moram em comunidades de ocupação irregular, formadas por uma segregação do espaço da cidade e pela dificuldade de acesso à terra urbana. Assim como trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra, sofrem com falta ou políticas públicas falhas do Estado.

A visita foi realizada por presidentas de Associação de Moradores de Bairro, assistentes sociais e educadores e educadoras sociais que integram o projeto ‘Formação Político–Cidadã para o mundo do trabalho’, desenvolvido através de parceria entre o Cefuria e a Fundação de Ação Social – FAS.

No assentamento, puderam conhecer a história de luta e resistência de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Escola Latino Americana de Agroecologia.

Assentamento Contestado (30_05_2016) (243)Coordenadora do Projeto e integrante do Cefuria, Fernanda Lima explica que a visita integra uma série de atividades que indicam novas possibilidades de organização popular e desenvolvimento de trabalho que podem ser desenvolvidas com os grupos trabalhados pela FAS.

E aponta as relações de proximidade com as lutas do campo e da cidade. “Os territórios que os CRAS [Centros de Referência da Assistência Social do município] integrados no projeto fazem atendimento são territórios de ocupação irregular”, explica. E aponta a necessidade de articulação de uma luta pela efetivação de diversos direitos com essas comunidades. “Nesses espaços, uma das maiores dificuldades é o saneamento básico, já que às vezes as pessoas acreditam que o maior desafio – o de conseguir uma moradia – já foi resolvido”.

Essa foi a terceira visita a empreendimentos de economia solidária feita pelo grupo que está inserido no projeto de formação político-cidadã. Desenvolvido desde outubro de 2015, o projeto atende três comunidades de atuação da FAS : a Vila Harmonia, no bairro Barigui (Regional CIC), a Vila Parque Nacional, no Acrópole, (Regional Cajuru), e a Vila Beira Rio, do Bela Vista da Ordem (Regional Tatuquara).

Além da participação em oficinas de formação e de Metodologia Freireana, participantes do projeto já realizaram visitas em padarias comunitárias e associação de catadores.

Outro modo de olhar

Assentamento Contestado (30_05_2016) (165)Quem lutou pelo direito à terra na cidade se reconhece com a luta pela terra no campo. O Assentamento Contestado, que hoje conta com mais de 150 famílias, é uma conquista de anos de luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). “A gente nunca para de aprender e de construir”, aponta Capitani.

O Contestado está no local da antiga Fazenda Santa Amélia, que até 1991 pertencia ao grupo Incepa, empresa produtora de cerâmicas. Pelo alto valor em dívida com a previdência social, a terra foi destinada à Reforma Agrária e reconhecida como Assentamento em 1999, dando origem a um espaço de produção e troca de saberes agroecológicos.

As paredes de pedra do casarão revelam a idade da obra, feita no século XVIII, pelo trabalho de escravas e escravos. Da servidão ao conhecimento para libertação: o imóvel abriga desde 2005 a Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), que está em sua quarta turma de ensino técnico superior.

A área antes improdutiva não apenas agora produz alimentos, como produz alimentos e saberes através de um modelo que respeita o meio ambiente, as pessoas que produzem e consomem. A produção agroecológica – sem venenos, sem monocultivo e sem exploração dos trabalhadoras e trabalhadores – feita pelas famílias é utilizada para o consumo próprio e para a comercialização através da Cooperativa Terra Livre, criada no assentamento em 2010.

Durante o verão, época de maior produção, cerca de 20 toneladas de alimentos são produzidas semanalmente pela Cooperativa e encaminhadas ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), projeto do governo federal de compra de produtos da agricultura familiar.

Troca de experiências

Assentamento Contestado (30_05_2016) (353)Assistente social e coordenadora do CRAS, Márcia de Lima não conhecia o local, e diz ter aproveitado a experiência. “A visita faz a gente entender que as comunidades que a gente trabalha podem apoiar ou viver nesse mundo de outras formas além daquelas que elas já vivem”, aponta. “Se a gente conseguir levar essa visão de movimentos sociais para essas comunidades, vai ser bem importante”.

Também assistente social em CRAS de Curitiba, Jaqueline Lima destacou a importância da atividade. “Quando a gente sai daquela realidade e rotina burocrática, a gente vê que tem coisas bem diferentes do que estamos acostumadas a ver”.

Acompanhando a visita e a troca de experiências, o Integrante do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Eliseu Lino identifica proximidades na luta do MNPR e do MST. “Hoje, ouvindo as experiências, vimos que eles lutam também por saúde, educação… É a mesma luta que nós fazemos”.

Reconhecendo diferenças e semelhanças nas diferentes lutas, Capitani observa que a saída para o enfrentamento de diferentes problemas é uma só: “Se tem organização no campo e organização na cidade, não tem quem fica desamparado”.

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